
Síndrome da Alienação Parental (SAP)
Fernando Borges Vieira[i]
Richard Gardner – in The Parental Alienation Syndrome and the Differentiation Between Fabricated and Genuine Child Sex Abuse. Cresskill, NJ: Creative Therapeutics, Inc. (1987) – define a Síndrome de Alienação Parental (SAP) como:
(…) campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.
Assim, pode-se compreender a síndrome como um distúrbio infantil, que surge, principalmente, em contextos de disputa pela posse e guarda de filhos, o qual se manifesta por meio de uma campanha de difamação que a criança realiza contra um dos genitores, sem que haja justificativa para isso.
Devemos entender a síndrome como a programação de uma criança por um dos genitores, para que passe a enxergar e idealizar o outro genitor de maneira negativa, nutrindo, a partir de então, sentimentos de ódio e rejeição por ele, e externando tais sentimentos.
Tal ponto merece atenção especial, vez que a síndrome da alienação parental se refere à conduta do filho, enquanto a alienação parental diz respeito à conduta do genitor que desencadeia o processo de afastamento da criança do outro genitor.
A Lei 12.318 de 2010 dispõe acerca da alienação parental, conceituando-a em seu artigo 2º:
Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
As crianças e adolescentes que estão sob alienação parental apresentam a maioria – se não todos – dos seguintes sintomas:
- Uma campanha denegritória contra o genitor alienado.
- Racionalizações fracas, absurdas ou frívolas para a depreciação.
- Falta de ambivalência.
- O fenômeno do “pensador independente”.
- Apoio automático ao genitor alienador no conflito parental.
- Ausência de culpa sobre a crueldade a e/ou a exploração contra o genitor alienado.
- A presença de encenações ‘encomendadas’.
- Propagação da animosidade aos amigos e/ou à família extensa do genitor alienado.
Aos pais alienadores aplica-se o diagnóstico de transtorno delirante:
297.71 Transtorno delirante
- Delírios não-bizarros (isso é, envolvendo situações que ocorrem na vida real, tais como ser seguido, envenenado, contaminado, ser amado à distância, ser traído pela esposa ou amante, ou ter uma doença) com a duração de pelo menos 1 mês.
Dos vários subtipos do transtorno delirante, a mais aplicável à SAP é a seguinte:
Tipo Persecutório: delírio de que a pessoa (ou alguém de quem a pessoa é próxima) está de alguma forma sendo tratada malevolamente.
Esse diagnóstico, nos ensina Gardner, é geralmente aplicável ao doutrinador da SAP, que pode inicialmente reconhecer que as queixas sobre o comportamento do genitor alienado são fabricações conscientes e deliberadas. Entretanto, com o tempo, as fabricações podem transformar-se em delírio e serem tomadas como reais pelo genitor doutrinador. E o mesmo processo pode finalmente ser aplicável à criança. Especificamente, no início a criança pode reconhecer que as demonstrações de ódio são fingidas e servem para incrementar os laços de amizade da criança com o programador. Entretanto, com o tempo a criança pode vir a acreditar de fato no que eram originalmente fabricações conscientes e deliberadas. Quando esse ponto é alcançado o diagnóstico de transtorno delirante é aplicável à criança. Geralmente, este diagnóstico é aplicável aos programadores implacáveis que estão obcecados em seu ódio ao genitor-vítima, mas com o tempo a criança provavelmente terá incorporado o nível severo de SAP. É digno de nota que quando a SAP está ocorrendo, mais frequentemente se observa um sistema delirante limitado, circunscrito quase que exclusivamente ao genitor alienado. Esse diagnóstico pode igualmente ser aplicável à criança vítima de SAP, em especial à criança que está na categoria severa.
301.0 Transtorno de personalidade paranóide
- Uma desconfiança e uma suspeita difusas dos outros tais que seus motivos são sempre interpretados como malévolos, começando na idade adulta e presentes em uma variedade de contextos, sendo indicado por quatro (ou mais) dos seguintes sintomas:
- ter suspeitas, sem base suficiente, de que os outros são exploradores, prejudiciais, ou que o estão enganando.
- ficar preocupado, com dúvidas injustificadas, sobre a lealdade ou a confiabilidade dos amigos ou colegas.
- ficar relutante em confiar nos outros por causa do medo despropositado de que a informação seja usada de forma maliciosa contra si
- ler significados aviltadores ou ameaçadores escondidos em observações ou em eventos benignos
- carregar persistentemente rancores, isto é, ser implacável com insultos, ofensas ou deslizes.
- perceber ataques ao seu caráter ou reputação que não são aparentes aos outros e ser rápido em reagir irritadamente ou contra-atacar
- ter suspeitas periódicas, sem justificação, a respeito da fidelidade do esposo ou do parceiro sexual.
Como identificar, pois, a situação de alienação parental? A observação de comportamentos, tanto dos pais, avós ou outros responsáveis, quanto dos filhos, pode indicar a ocorrência da prática. No caso das crianças e dos adolescentes submetidos à alienação parental, sinais de ansiedade, nervosismo, agressividade e depressão, entre outros, podem ser indicativos de que a situação está ocorrendo. No caso dos pais, avós ou outros responsáveis, a legislação aponta algumas condutas que caracterizam a alienação parental.
Dentre as práticas capazes de configurar a alienação parental, a legislação prevê as seguintes:
- Realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
- Dificultar o exercício da autoridade parental;
- Dificultar o contato da criança ou do adolescente com o genitor;
- Dificultar o exercício do direito regulamentado à convivência familiar;
- Omitir deliberadamente ao genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou o adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
- Apresentar falsa denúncia contra o genitor, contra familiares deste ou contra os avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou o adolescente;
- Mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando dificultar a convivência da criança ou do adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com os avós.
Conforme prevê o art. 6º da Lei 12.318/10, que trata do tema, uma vez caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência da criança ou do adolescente com o genitor ou com a genitora, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e segundo a gravidade do caso, adotar as seguintes medidas:
- Advertir o alienador;
- Ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
- Estipular multa ao alienador;
- Determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
- Determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
- Determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; ou
- Declarar a suspensão da autoridade parental.
Por outro lado, se for caracterizada a mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar (visitas), o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou o adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
Importante concluir, a alienação parental prejudica a todos, alienados e alienadores, pois impede a convivência familiar equilibrada, requisito imprescindível para que crianças e adolescentes se desenvolvam de forma saudável e possam se tornar, futuramente, pais e mães capazes de estabelecer uma relação familiar – inclusive matrimonial – segura.
Para que se conheça o tratamento jurídico a respeito da Alienação Parental, transcrevemos o texto da Lei 12.318 de 26 de Agosto de 2010:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Esta Lei dispõe sobre a alienação parental.
Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II – dificultar o exercício da autoridade parental;
III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Art. 3o A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.
Art. 4o Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.
Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.
Art. 5o Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial.
§ 1o O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.
§2o A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.
§3o O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.
Art. 6o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III – estipular multa ao alienador;
IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII – declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
Art. 7o A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.
Art. 8o A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de decisão judicial.
Art. 9o (VETADO)
Art. 10. (VETADO)
Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
[i] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519 e OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados e Owner e Legal Coach de Lawyers Coaching/Desenvolvimento de Performance e Competências Jurídicas – Conselheiro Secional da OAB/SP – Membro da IV Câmara do Tribunal e Ética e Disciplina da OAB/SP, Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Professor de Pós-Graduação Direito Processual do Trabalho– Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) – Associado ao Instituto Brasileiro de Compliance (IBC) – Associado ao Instituto de Compliance do Brasil (ICB) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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