
A atual polêmica sobre honorários advocatícios na justiça do trabalho.
Fernando Borges Vieira[i]
Antes da denominada Reforma Trabalhista – a qual se deu em razão da Lei. 13.467/17 – inexistia regramento consolidado que tratasse de honorários sucumbenciais no processo trabalhista, sendo certo que as diretrizes emanavam da aplicação da Súmula 219 do Tribunal Superior do Trabalho.
Referida Súmula, determinava – em sua primeira parte – que a percepção de honorários de sucumbência estava atrelada a duas condições, quais sejam: a) estar a parte assistida por sindicato da categoria profissional e b) comprovar a parte percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família (art. 14, § 1º, da Lei nº 5.584/1970).
Com efeito, apenas haveria condenação em honorários de sucumbência se a parte vencedora na demanda estivesse assistida por sindicato e comprovasse hipossuficiência econômica, não se olvidando o fato de que os mesmos eram limitados à razão de 15% (quinze por cento).
Com o advento da entrada em vigor do então Novo Código de Processo Civil (2015) – com aplicação subsidiária ao processo do trabalho (CLT, art. 769) – o Tribunal Superior do Trabalho alterou seu entendimento e, por via de direta consequência, a redação da súmula em tela. Todavia, a corte manteve sua posição quanto a excepcionar a condenação de honorários sucumbenciais na seara trabalhista.
Neste sentido, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Instrução Normativa 27/2005, a qual prevê que, para as lides que não envolvam relação e emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência – a exemplo de ação de cobrança de contribuição sindical. Desta forma, as lides cujo objeto refere-se à relação de emprego não ensejariam a condenação em honorários sucumbenciais.
Superando esta questão, a Lei 13.467 de 13 de julho de 2017 – vigente a partir de 11 de novembro de 2017 – inseriu o artigo 791-A na Consolidação das Leis do Trabalho, por meio e força do qual estabeleceu a obrigação da parte vencida na demanda trabalhista a pagar honorários sucumbenciais ao advogado da parte que a venceu.
Desta feita, em sendo o Reclamante sucumbente total ou parcialmente na demanda, passou o mesmo a responder pela nova obrigação, condição que acabou por impor vigorosa cautela na distribuição de reclamatórias e na formulação de pedidos.
Eis o novo regramento:
Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.
- 1º Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.
- 2º Ao fixar os honorários, o juízo observará: I – o grau de zelo do profissional; II – o lugar de prestação do serviço; III – a natureza e a importância da causa; IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
- 3º Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.
- 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
- 5º São devidos honorários de sucumbência na reconvenção.
Grande dúvida surgiu quanto a aplicação desta regra em relação aos processos ajuizados antes de sua vigência. Alguns magistrados compreendem que a nova regra não se aplica às demandas ajuizadas antes de 11 de novembro de 2017, já outros compreendem que a mesma se aplica àquelas ajuizadas antes de tal data, mas ainda não julgadas.
Importante salientar neste diapasão, o Código de Processo Civil adota em seus artigos 14 e 1.046 (em consonância com o princípio da irretroatividade da lei estampado no inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal) o sistema do isolamento dos atos processuais, à luz do qual a nova lei, embora aplicável aos processos em trâmite, não interfere nos atos processuais já consumados.
Na hipótese de honorários de sucumbência, o direito é fixado em sentença (CPC, art. 85), razão pela qual a compreensão segue no sentido de que importará saber se a sentença foi proferida antes ou depois da entrada em vigor do novo regramento.
Nesse sentido já havia decidido o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 1.465.535-SP, de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, em acórdão publicado no DJe de 22 de agosto de 2016:
Recurso especial. Processo civil. Arbitragem. Execução. Título executivo extrajudicial. Contrato de locação. Cláusula compromissória. Embargos do devedor. Mérito. Competência do juízo arbitral. Questões formais, atinentes a atos executivos ou de direitos patrimoniais indisponíveis. Competência do juízo estatal. Honorários advocatícios. Natureza jurídica. Lei nova. Marco temporal para a aplicação do CPC/2015. Prolação da sentença. […] 6. O superior tribunal de justiça propugna que, em homenagem à natureza processual material e com o escopo de preservar-se o direito adquirido, as normas sobre honorários advocatícios não são alcançadas por lei nova. A sentença, como ato processual que qualifica o nascedouro do direito à percepção dos honorários advocatícios, deve ser considerada o marco temporal para a aplicação das regras fixadas.
Na mesma senda, mais especificamente a respeito da aplicação da mencionada Lei 13.467/2017, já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal, por meio de sua 1ª Turma:
Agravo interno. Recurso extraordinário com agravo. Honorários advocatícios no processo do trabalho. Art. 791-A da Consolidação das Leis do Trabalho, introduzido pela lei 13.467/2017. Inaplicabilidade a processo já sentenciado. 1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente – a lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada “reforma trabalhista”. 2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (Ag. reg. no recurso extraordinário com agravo nº 1.014.675-MG, rel. min. Alexandre de Moraes).
Oportuno conhecer trecho do acórdão lavrado pelo Ministro Alexandre de Moraes:
(…) A ora agravante postula a aplicação da norma neste caso, de modo que a parte adversa seja condenada a lhe pagar honorários de advogado.
Sem razão, contudo. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.
Tampouco cabe aplicação subsidiária do Código de Processo Civil de 2015, no tocante ao arbitramento dessa verba em fase recursal, na medida em que tal prática pressupõe previsão de honorários na origem, o que não se verifica no caso.
Nada obstante a compreensão pretoriana, a Procuradoria Geral da República ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.766) por meio da qual questiona três artigos da Lei 13.467/2017, quais sejam: 790-B, 791-A e 844 consolidados. Em tal ação, Rodrigo Janot – então Procurador Geral da República – sustenta que o Código de Processo Civil não sede espaço a dúvida de que a gratuidade judiciária abrange custas, despesas processuais e honorários advocatícios.
O Ministro Luís Roberto Barroso – a qual cabe a relatoria da ação – não considerou tal regra inconstitucional, mas acolheu parcialmente o pedido para fixar o limite dos honorários sucumbenciais, o qual há de respeitar a razão máxima de 30% (trinta por cento) dos créditos trabalhistas porventura deferidos ao postulante.
A seu turno, o Ministro Luiz Edson Fachin divergiu do relator e considerou os dispositivos impugnados inconstitucionais, manifestando-se no sentido de que em mudanças legislativas de restrição de direitos fundamentais o risco é evidente e real, porque não se está atacando esses direitos em si apenas, mas todo um sistema jurídico-constitucional.
O julgamento da ADI 5.766 está pendente do voto dos demais Ministros do Supremo Tribunal Federal e a solução para a questão ainda está por vir e, por certo, o que prevalece neste tempo ainda é a aplicação da lei em vigor.
Ressalte-se que se o artigo 791-A consolidado for declarado inconstitucional perderá sua eficácia e haverá reflexo direto no processo trabalhista, inclusive nas demandas já sentenciadas.
Por fim, devo registrar que é extremamente necessário que se estabeleça de uma vez por todas a segurança jurídica em relação à questão trazida à baila de sorte a se estabelecer e a modular a regra que prevalecerá, pois só assim o judiciário agirá de forma uníssona e evitará reiterados questionamentos.
[i] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519 e OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados – Bacharel em Direito (FMU) – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Mestre em Direito (Universidade Mackenzie) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Professor de Pós-Graduação Direito Processual do Trabalho – Diretor do Núcleo de Direito Processual do Trabalho da OAB/SP/Jabaquara – Membro da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP – Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (ATSP) – Associado ao Instituto Brasileiro de Compliance (IBC) – Associado ao Instituto de Compliance do Brasil (ICB) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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