
Home Office – Dicas para evitar a síndrome de Burnout
Fernando Borges Vieira[1]
A Constituição Federal de nosso país – a exemplo de diplomas constitucionais estrangeiros – prevê o direito do trabalhador a um ambiente de trabalho saudável, com maior razão no seio do inciso VI do artigo 170, inciso VIII do artigo 200 e caput do artigo 225, cuja transcrição se faz sob o escopo de possibilitar a melhor compreensão:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…) VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (…)
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (…) VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Admitir um ambiente de trabalho enquanto se presta serviço na sede do empregador não é tarefa difícil; entretanto, como pensar em ambiente de trabalho à luz da realidade que tomou de assalto a vigorosa maioria de nós, qual seja, o trabalho em regime home office?
Nesta oportunidade nos propomos a apresentar e tecer algumas considerações sobre a Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional, cuja origem repousa justamente na inobservância da tutela jurídica em favor de um ambiente de trabalho saudável.
O termo burnout é formado pela junção dos termos ingleses burn (queimar) e out (exterior), significando um estado de tensão emocional e estresse crônico provocado por condições de trabalho desgastantes e com graves repercussões na saúde física e mental do trabalhador, bem como em sua vida profissional, social e familiar.
A Síndrome de Burnout – ou síndrome do esgotamento professional – se trata de um distúrbio psíquico descrito já em 1974 pelo médico Americano Freudenberger e está registrado no Grupo V da CID-10/Z73.0: Problemas relacionados com a organização de seu modo de vida – Esgotamento.
Dos primeiros a listarem os sintomas desse esgotamento profissional, estão o psicólogo alemão Herbert Freudenberger e a psicóloga norte-americana Gail North. Eles descrevem os 12 estágios (que não são necessariamente etapas, mas sinais) do burnout:
- Compulsão em provar o próprio valor;
- Trabalhar sempre mais, com incapacidade de se desligar;
- Negligenciar as próprias necessidades;
- Fugir de conflitos;
- Valores pessoais são revisados, e o foco está apenas no trabalho;
- Negar os problemas, como uma crescente intolerância, e perceber os colegas de trabalho como incompetentes, preguiçosos e indisciplinados;
- Reduzir a vida social;
- Mudar o comportamento de forma óbvia para família e amigos;
- Despersonalização, incapacidade de ver a si mesmo como alguém com valor;
- Vazio interno, que leva a pessoa a comportamentos compulsivos na alimentação, sexo e no uso de drogas;
- Depressão; e
- Síndrome de burnout, com o colapso físico e mental total.
A relação da síndrome esgotamento profissional com o trabalho poderá estar vinculada aos fatores que influenciam o estado de saúde: riscos potenciais à saúde relacionados com circunstâncias socioeconômicas e psicossociais, tal como ritmo de trabalho penoso (CID 10/Z56.3) e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas ao trabalho (CIS 10/Z56.6).
Muitos são os seus sintomas, mas podemos destacar como sendo os principais fortes dores de cabeça, tonturas, tremores, falta de ar, oscilações de humor, distúrbios do sono, dificuldade de concentração e problemas digestivos, dentre outros.
Em uma relação de causa e consequência, o trabalhador não produz como poderia produzir se em seu estado psicológico inalterado o que lhe induz à uma cobrança excessiva e temor no exercício de suas atividades.
Conforme Manual de Procedimentos para os Serviços de Saúde do Ministério da Saúde do Brasil e Organização Pan-Americana da Saúde/Brasil – Doenças Relacionadas ao Trabalho[2], a prevenção da Síndrome de Esgotamento Profissional envolve mudanças na cultura da organização do trabalho, estabelecimento de restrições à exploração do desempenho individual, diminuição da intensidade de trabalho, diminuição da competitividade, busca de metas coletivas que incluam o bem-estar de cada um.
Ao se suspeitar que um trabalhador apresente tais características, o Ministério da Saúde recomenda às empresas: i) informar ao trabalhador; ii) examinar os expostos, visando a identificar outros casos; iii) notificar o caso aos sistemas de informação em saúde (epidemiológica, sanitária e/ou de saúde do trabalhador), por meio dos instrumentos próprios, à DRT/MTE e ao sindicato da categoria; iv) providenciar a emissão da CAT, caso o trabalhador seja segurado pelo SAT da Previdência Social e v)orientar o empregador para que adote os recursos técnicos e gerenciais adequados para eliminação ou controle dos fatores de risco.
Não são raras as demandas trabalhistas por força das quais os trabalhadores buscam a reparação pelos prejuízos materiais e morais experimentados em razão do esgotamento profissional, pois muitos empregadores e exacerbam no controle e cobrança de metas e resultados e até mesmo no poder gerência sob seus liderados.
Equivoca-se quem pensa que o trabalho à distância – ou teletrabalho – afasta do empregado condições que pode conduzi-lo ao esgotamento profissional! Quem assim compreende apresenta por argumento o fato de que o trabalhador está em casa, junto aos seus, sem sofrer as agruras do trânsito e com mais tempo para dedicar-se a si e aos familiares.
Qual o quê! O trabalho à distância muitas vezes é um dificultador e não um facilitador. Poderia eu aqui elencar uma série de fatores que se apresentam como desvantagem como o aumento do fluxo de trabalho, reuniões improdutivas, tendência ao isolamento social (muito embora seja necessário nestes tempos de pandemia), redução do networking, falta de motivação profissional e conflitos pessoais e interpessoais provocados pela confusão de ambientes.
Além, há um aspecto muito importante e que tem conduzido muitos profissionais à síndrome sobre a qual versamos: aumento do fluxo de trabalho e cobrança de resultados.
Por óbvio, o isolamento social e a necessidade de que as equipes de trabalho permaneçam divididas, cada membro do time em seu próprio ambiente, gera insegurança aos gestores e, por tal razão, a cobrança acaba sendo mais rigorosa, inclusive quanto aos resultados. Desta forma, buscando resultados mais céleres e favoráveis (teoricamente considerado), os líderes e chefes (longe de significar o mesmo) acabam, por vezes, extrapolando.
Seria pueril de mais atribuir a responsabilidade a líderes e chefes, pois certamente os mesmos também estão sendo – e muito – pressionados pelos donos de negócios, o quais se veem obrigados a superar todas as dificuldades geradas pela pandemia e que certamente repercutem sobre faturamento e planejamento.
Não foram ou são poucos os donos de negócio que tiverem de reduzir o número de trabalhadores e, nada obstante, manter ou até mesmo potencializar os resultados e, por conseguinte, de se esperar que a cobrança recaia sobre todos – este ponto, os trabalhadores, preocupados com a manutenção do posto de trabalho, acabam por sucumbir à pressão que lhes é imposta.
Com o devido respeito à história de vida de todos, há um limite: a saúde!
A Revista Forbes[3] revela pesquisa sobre a alteração de horário vivenciada pelos trabalhadores em regime de teletrabalho. Segundo a pesquisa, os trabalhadores estão sentindo a pressão para ter um bom desempenho e, por sua vez, trabalhar mais horas. Mais pessoas estão trabalhando fora do dia normal de trabalho, das 9h às 17h. Não ter deslocamento diário ou deixar os filhos creche significa mais produtividade no início da manhã. Assim, os empregados estão começando a trabalhar cada vez mais cedo em relação ao período antes da pandemia, em um aumento de 26% às 4h00min, 23% às 5h00min e 22% às 6h00min. No entanto, há uma queda de atividade à tarde, por volta das 13h00min às 17h00min, em que a equipe de estudo especulou ser a hora ficar com a família e exercer outras responsabilidades. Enquanto isso, os resultados observaram a retomada do trabalho no final da noite, com um aumento de 30% em relação aos acessos pré-Covid à 1h00min e um alta de 34% às 2h00min.
A revista Grandes Empresas & Pequenos Negócios [4] publicou matéria trazendo 10 dicas para um trabalho saudável e seguro em home office:
- Fique calmo: “Ficar em casa pode ser muito solitário. Tente manter a calma. Ouça música, coloque um filme engraçado em segundo plano… faça o que for preciso para criar um ambiente acolhedor.” – Carlota Zimmerman, estrategista de carreira.
- Tenha uma zona livre de estresse: “Certifique-se de ter uma zona livre de estresse no trabalho (sim, mesmo trabalhando de casa). Tenha uma sala de descanso. Não é preciso um ambiente sofisticado. Tudo o que você precisa é de iluminação suave e um local confortável para se sentar. Crie e escute uma playlist relaxante e agradável” – Dra. Tasha Holland-Kornegay, autora, palestrante e profissional de saúde mental.
- Levante-se: “Não trabalhe na cama. Você quer que sua cama seja um lugar de paz e tranquilidade, não de estresse do trabalho” – Liz Grossman Kitoyi, cofundadora e CEO da Baobab Consulting.
- Tenha um ambiente mais verde: “Se você trabalha em casa, pode passar dias sem sair, especialmente em climas frios. Ter algumas plantas pode fazer uma grande diferença no seu espaço de trabalho” – Michael Alexis, CEO da criação da Team Building.
- Estabeleça um lugar para onde não ir: “Nem todo mundo tem um escritório, então não há problema em trabalhar na mesa de jantar ou no sofá. Meu conselho é: tente criar um espaço entre os locais em que você está trabalhando e os locais em que está relaxando, mesmo que pareça um pouco bobo ficar em dois lados diferentes do sofá.” – Hailley Griffis, líder de comunicação na Buffer.
- Arrume-se: “Acorde e se arrume como quem está indo para o trabalho. Se você ficar de chinelos o dia todo, não será tão produtivo.” – Elijah Schneider, CEO e fundador da Modifly.
- Feche a porta: “O mais importante é ter um escritório dedicado, onde você possa fechar a porta e fixar o horário comercial. Fiz o oposto e permiti que o trabalho engolisse minha vida em casa por um tempo. Erro estúpido.” – Kathy Kristof, editor do SideHusl.com.
- Crie rotinas: “Estabeleça uma rotina pré-trabalho e uma rotina pós-trabalho. Sem limites apropriados, trabalhar no mesmo local em que você acorda, come e dorme pode levar qualquer pessoa à loucura.” – Marissa Owens, do Opportunity Business Loans.
- Mantenha-se conectado: “Mantenha uma janela de chat com a equipe. Não há nada mais importante em um projeto remoto em grupo do que a comunicação casual. Não apenas e-mails oficiais e atualizações de trabalho, mas a capacidade de conversar e descontrair.” – Melinda Watts, vice-presidente de segurança do Zeno Group.
- Não se esqueça da segurança: “Os hackers estão explorando as vulnerabilidades de segurança que vêm com o trabalho remoto. Quando as pessoas estão assustadas e isoladas, é muito mais fácil atacá-las, porque elas não estão fazendo uma boa higiene cibernética – é a última coisa com que elas geralmente se preocupam durante situações de pânico.” – Aleksandr Yampolskiy, CEO da SecurityScorecard
Não permita ser oprimido pela pressão do trabalho, estabeleça rotinas e horários de trabalho e não se sinta “culpado” por estar em casa, o mundo está – ao menos deveria.
Por fim, a mais valiosa dica: respeite-se!
Mesmo à distância o trabalhador pode ser acometido pelo esgotamento profissional e a Justiça Especializada do Trabalho tem reconhecido, em grande parte das vezes, o direito dos postulantes à reparação e até mesmo à reintegração de empregado afastado durante a estabilidade gerada pela doença em tela.
Assim, reiteradamente recomendamos aos nossos clientes que sempre permaneçam atentos à qualidade do ambiente de trabalho e saúde de seus empregados, pois – como costumo afirmar: melhor prevenir a indenizar!
[1]Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados e Owner e Legal Coach de Lawyers Coaching/Desenvolvimento de Performance e Competências Jurídicas – Conselheiro Secional da OAB/SP – Membro da IV Câmara do Tribunal e Ética e Disciplina da OAB/SP – Palestrante da OAB/SP – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB Nacional – Membro da Comissão de Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação da OAB Nacional – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP (2019/2020) – Membro Efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/RJ – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Leadership and Team Development (International Business Management Institute de Berlim – Alemanha) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
[2] http://dtr2001.saude.gov.br/editora/produtos/livros/pdf/02_0388_M1.pdf.
[3] 4 erros comuns no home office e como corrigi-los – Forbes Brasil
[4] 10 dicas para tornar o home office mais produtivo e saudável – Pequenas Empresas Grandes Negócios | Gestão de Pessoas (globo.com)
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