
Recomendações sobre relacionamento amoroso no ambiente de trabalho
Fernando Borges Vieira[1]
Antecedendo nossas considerações, desde já esclarecemos: Proibir relacionamentos amorosos entre funcionários é inconstitucional. É isso que prevê o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, quando afirma que ‘são invioláveis a intimidade e a vida privada das pessoas’ – isto é, a empresa não pode impedir o relacionamento.
Inexistindo excessos ou condutas impróprias no ambiente de trabalho não há previsão de justa causa; todavia, o artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho prevê que incontinência de conduta é passível demissão motivada. Se de um lado a empresa não pode proibir o relacionamento, deve ser observado o limite do que é permitido ou não, o que deve ser determinado pelo empregador por meio do regimento interno ou código de ética da empresa.
Respeitadas exceções, é muito comum que o empregado (refiro-me à espécie e não ao gênero, razão pela qual de considerar-se também a empregada) dedique maior parte de sua vida às horas de trabalho, o que importa em estabelecer que – muito provavelmente – seu relacionamento pessoal com colegas supere o tempo de relacionamento com pessoas estranhas à empresa.
Desta convivência diária é possível surgir sentimento que extravase a esfera do coleguismo ou da simples amizade, nascendo um sentimento de caráter amoroso.
Duas podem ser as ações do empregado que permitiu – como se fosse possível impedir – o surgimento deste sentimento: conservá-lo consigo e não o manifestar ou noticiá-lo ao outrem.
Na hipótese de o empregado encerrar em si mesmo seu sentimento, não haverá problema no que concerne ao ambiente de trabalho. Todavia, se o empregado o manifestar a repercussão pode ser danosa, conforme passo a considerar.
Se o sentimento não for correspondido, pode ser que passe a existir certo mal-estar entre os empregados envolvidos; ainda, se houver alguma insistência ou condutas inapropriadas, poderá ser caracterizado assédio sexual.
Ocorre, se o sentimento for correspondido, estaremos diante de outro problema: pode a empresa coibir em seus regulamentos o relacionamento entre empregados? A resposta é simples: sob a ótica de nosso ordenamento jurídico, nãO!
Importa perceber o fato de que muitas empresas multinacionais apenas traduzem o código de ética matriz e, dependendo de sua nacionalidade, é possível – à luz da legislação vigente no país de origem – que a política interna seja regulamentada no sentido de ser proibido o relacionamento entre empregados.
Em nosso país, no entanto, tal regulamentação é considerada inconstitucional, pois ingressa na vida privada das pessoas, na intimidade de cada qual, o que não é suscetível ao poder de gerência do empregador.
De outra monta, é compreensível que o empregador não queira que empregados de sua empresa mantenham relacionamento, pois pode haver – ao menos em tese – a concessão de privilégios, a desatenção com o próprio trabalho e uma séria de outras questões que podem trazer consigo o condão de interferir negativamente no ambiente de trabalho – com maior razão se o namoro for entre empregados hierarquicamente vinculados ou do mesmo setor.
A solução deste problema que nos parece igualmente simples. O empregador pode, sem causar espécie alguma de constrangimento ou detrimento aos empregados, transferir um dos trabalhadores para outro setor, evitando que durante o horário de trabalho permaneçam próximos.
Convém salientar, não pode restar caracterizada espécie alguma de discriminação ou qualquer detrimento ao empregado transferido, eis porque se aconselha que esta transferência seja realizada às claras e com a devida aquiescência, conscientizando-se os empregados envolvidos que se trata de medida preventiva e que os beneficia.
Sendo nossa particular compreensão, também é razoável que o Departamento de Recursos Humanos convoque os envolvidos e de forma hábil e respeitosa os oriente no sentido de que mantenham uma postura profissional durante o expediente.
Sentimo-nos obrigados a pontuar que regra alguma no mundo, seja a qualquer o tempo ou em qualquer espaço, terá o poder de sucumbir o amor entre duas pessoas. E, como o poder do empregador é limitado pela reserva e respeito à intimidade da pessoa humana, punir os namorados com a dispensa sem justa causa não nos parece ser mesmo a medida mais acertada.
Em conclusão, em que pese não haver na legislação brasileira proibição de que colegas se relacionem, normas e regulamentos internos das empresas podem conter proibição de relacionamento amoroso entre seus empregados.
Importante destacar, embora o amor seja inevitável, algumas atitudes devem ser evitadas, pois não podemos esquecer que o trabalho é, acima de tudo, um ambiente sério e profissional. apesar de decisões na justiça favorecerem o namoro entre colegas de trabalho, é preciso priorizar o respeito aos limites, evitando-se condutas impróprias para o ambiente de trabalho, sob pena de aplicação de advertência verbal ou escrita, suspensão e, em casos mais graves, a dispensa por justa causa, nos moldes do artigo 482, alínea b, da Consolidação das Leis do Trabalho.
Como devem proceder, pois, empregado e empregador?
Recomendamos aos empregados: a) conheça e respeite a política interna da empresa quanto à possibilidade e limites de relacionamento entre empregados; b) não esconda o relacionamento e comunique o responsável pelo Departamento de Recursos Humanos da empregadora; c) mantenha postura adequada e evite demonstrações públicas de carinho; d) separe o “profissional” do “pessoal”, por exemplo, não promova qualquer espécie de favorecimento em favor do par amoroso, a não ser que haja critério objetivo e merecimento (também não é correto prejudicar) e e) busque trabalhar em equipes, setores ou locais diferentes.
Recomendamos aos empregadores: a) estabelecer política interna quanto a relacionamentos amorosos entre empregados; b) dar publicidade e promover orientação dos empregados em relação à política interna; c) no caso de conhecer relacionamento amoroso entre empregados, orientá-los e alertá-los sobre a política em referência; d) buscar, junto com os empregados, equacionar a questão sem “radicalismos”; e) se caso, transferir um dos empregados de equipe, setor ou local de prestação de serviços e f) apenas rescindir o contrato de trabalho na hipótese de restar caracterizada real incontinência de conduta, competindo ao empregador reunir provas robustas a respeito desta.
Importante considerar, se a empresa demitir os empregados que se relacionam pelo “simples fato” de estarem se relacionando pode restar caracterizada – muito provavelmente o será – a dispensa discriminatória, ensejando a reparação dos danos morais experimentados.
Também importante salientar, o relacionamento amoroso homoafetivo há de receber as mesmas tratativas dadas ao relacionamento amoroso homoafetivo; se houver discriminação também haverá a possibilidade de que a empresa responda pelos danos extrapatrimoniais.
Enfim, eis a regra de ouro: ética e bom senso!
[1] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados e Owner e Legal Coach de Lawyers Coaching/Desenvolvimento de Performance e Competências Jurídicas – Conselheiro Secional da OAB/SP – Membro da IV Câmara do Tribunal e Ética e Disciplina da OAB/SP – Palestrante da OAB/SP – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB Nacional – Membro da Comissão de Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação da OAB Nacional – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP (2019/2020) – Membro Efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/RJ – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Leadership and Team Development (International Business Management Institute de Berlim – Alemanha) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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