
O trabalho sob o regime intermitente como alternativa de superação da atual crise
Fernando Borges Vieira[i]
A pandemia que nos assola tem gerado muitos problemas trabalhistas, mormente a perda de postos de trabalho. Para tentar superar essa crise algumas empresas adotaram o regime de trabalho intermitente previsto no artigo 443, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho, uma alternativa válida.
Antes do advento da recente “reforma trabalhista”, a Consolidação das Leis do Trabalho não regulamentava o trabalho intermitente, sendo que até então o mínimo possível de se contratar eram 25 horas semanais o que caracteriza regime de tempo parcial.
Em breve notícia, antes de entrar em vigor a Lei 13.467/2017 – o que se deu em 11 de novembro de referido ano – os contratos de trabalho sob o regime de tempo parcial eram limitados por 25 horas semanais, não permitindo a sobrejornada de trabalho e as férias – as quis não poderiam ser convertidas em abono pecuniário – variavam de 08 a 18 dias, dependendo da quantidade de horas trabalhadas na semana.
Após a reforma trabalhista, o máximo de horas permitido passou a ser 30 horas semanais, não permitidas as horas extras ou 26 horas semanais com a efetivação de até 6 horas extras por semana. As férias por sua vez, serão de 30 duas e pode haver conversão em abono pecuniário.
Nada obstante, o artigo 443 da Consolidação das Leis do Trabalho passou a prever a figura do “trabalho intermitente”, sendo esta sua nova redação:
Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente. …………………………………………………………………………………………………………………………………………………..§ 3o Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.
O contrato intermitente, como possível perceber, não define uma carga horária mínima de horárias trabalhadas. Na prática, o empregado poderia até ser contratado para prestar duas horas de serviço por semana — ou por mês, lembrando que os limites máximos de jornada garantidos previstos pela Constituição Federal foram mantidos, quais sejam: 44 horas semanais e 220 horas mensais.
Trabalho intermitente é, pois, uma nova modalidade de contrato de trabalho, tendo por principal característica a descontinuidade do trabalho, acreditando-se que as empresas terão mais flexibilidade para contratar mão de obra e os trabalhadores, por sua vez, poderão sofrer a variação entre períodos de prestação de serviço e inatividade.
A intenção desta nova modalidade é oficializar o q e se conhece popularmente por “bicos”. Por seu intermédio, o trabalhador atua apenas quando recebe uma convocação do empregador e recebe por hora trabalhada, cujo mínimo deve corresponder ao salário mínimo vigente dividido por 220 horas, o que resulta em R$ 4,33 (quatro reais e trinta e três centavos) por hora trabalhada, nada impedindo que seja ajustado um valor maior.
Ao assinar o contrato de trabalho sob o regime intermitente, o empregado poderá vir a receber ganhos inferiores ao salário mínimo, e, portanto, terá de “completar a diferença” referente às contribuições ao Instituto Nacional do Seguro Social – ressaltando-se que alei determina que quem não recolher esse valor adicional não terá direito aos benefícios previdenciários, como é o caso da aposentadoria e do auxílio-doença.
Ainda, ao ser contratado sob o regime sobre o qual versamos, o trabalhador também tem direito a férias proporcionais com acréscimo de um terço, décimo terceiro proporcional, repouso semanal remunerado, depósitos fundiários e até mesmo a horas extras caso exceda a jornada padrão.
Como o empregado estará em stand by, a empresa deve convocá-lo com pelo menos três dias de antecedência sob pena de, se assim não o fizer, o empregado poder negar a prestação de serviços.
Importante convocar atenção ao fato de que, se por ventura o empregador não fizer nenhuma convocação em um determinado mês, o empregado não recebe salário, sendo oportuno esclarecer que não há um mínimo obrigatório de horas.
Para efeitos de cálculo da contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social, deve-se atentar à seguinte fórmula:
CONTRIBUIÇÃO INSS = (SALÁRIO MÍNIMO – SALÁRIO RECEBIDO) x 8%
Enfim, estas são as principais características do contrato de trabalho sob o regime intermitente, compreendendo-se por vantagens a geração de mais postos de trabalho, a formalização dos “bicos”, a garantia de benefícios trabalhistas – a exemplo do registro do contrato na Carteira de Trabalho e Previdência Social – e previdenciários e jornada de trabalho flexível, já pode desvantagens pode-se considerar os salários mais tacanhos e a necessidade de complementação ao Instituto Nacional do Seguro Social no caso do salário pago no mês não atingir o salário mínimo.
Há quem compreenda nesta modalidade de contrato de trabalho haver a precarização de direitos trabalhistas e, por outro lado, há que compreenda haver maior possibilidade de geração de empregos; todavia, trata-se de realidade com as qual teremos de lidar.
O trabalho intermitente é uma forma de prestação de serviços que vem sendo reconhecida em todo o mundo como uma modalidade necessária para se ajustar uma relação existente na sociedade contemporânea preservando os direitos fundamentais trabalhistas.
Assim sendo, em virtude das peculiaridades que envolvem essa modalidade de prestação de serviços, é certo afirmar que as empresas que a adotaram antes da pandemia do covid-19 tiveram despesas trabalhistas reduzidas, o que naturalmente ajuda a evitar a onda de demissão dos colaboradores.
[i] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados e Owner e Legal Coach de Lawyers Coaching/Desenvolvimento de Performance e Competências Jurídicas – Conselheiro Secional da OAB/SP – Membro da IV Câmara do Tribunal e Ética e Disciplina da OAB/SP – Palestrante da OAB/SP – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB Nacional – Membro da Comissão de Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação da OAB Nacional – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP (2019/2020) – Membro Efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/RJ – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Leadership and Team Development (International Business Management Institute de Berlim – Alemanha) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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