
O Contrato individual de trabalho e a medida provisória 936
Fernando Borges Vieira[1]
Desde a reforma trabalhista implementada pela Lei 13.467/17 não há tantas alterações tão significativas nas relações de trabalho quanto as previstas na Medida Provisória 936, cujas principais finalidades são: preservação do emprego e da renda, garantia da continuidade das atividades laborais e empresariais; redução da jornada de trabalho e salário e suspensão do contrato de trabalho.
Intitulada de “Programa Emergencial de Manutenção do Emprego” a Medida Provisória tem por premissas gerais a adesão sempre por acordo entre as partes.
A normatização alcança todos empregadores, com exceção de órgãos públicos, empresas estatais e organismos internacionais, bem como todos os empregados, inclusive domésticos, em regime de jornada parcial, intermitentes e aprendizes.
Importante salientar, as medidas somente poderão ser implementadas com a concordância do empregado e tem por duração o prazo de 90 dias ou enquanto persistir o estado de calamidade pública. Saliente-se, decidiu o Supremo Tribunal Federal não ser necessária a interveniência dos Sindicatos, muito embora sempre haja espaço para acordos ou convenções coletivas.
A MP 936/20 traz significativos impactos sobre o contrato de trabalho, conforme destacamos:
a) Permitir a suspensão do contrato de trabalho por até 60 dias, dividido em até 2 períodos de 30. As empresas com faturamento superior a R$ 4,8 milhões deverão pagar uma ajuda compensatória no valor de 30% do salário do empregado.
b) A ajuda compensatória, de natureza indenizatória, não é base de cálculo de tributos, poderá ser paga por qualquer empresa na suspensão ou redução. Só será obrigatória para a suspensão de empresas com faturamento superior a R$ 4,8 milhões.
c) O Tesouro pagará um benefício emergencial, com base de cálculo equivalente à do seguro-desemprego nesse período. Se for redução de jornada, aplica-se o percentual da mesma (25%, 50% ou 70%). Exemplo, a pessoa teria direito a um seguro-desemprego de R$ 2000,00. O benefício emergencial será calculado aplicando-se 0,25 (R$ 500), 0,5 (R$ 1.000,00) ou 0,7 (R$ 1.400,00) sobre esse valor. Se for suspensão, benefício é de 100%;
d) O trabalhador cujo contrato é intermitente terá um benefício emergencial com valor fixo de R$ 600,00, semelhante ao auxílio emergencial ao informal.
e) Concedido o benefício, o empregado terá garantia provisória do emprego no período de redução e/ou suspensão e no período equivalente após a retomada do contrato normal, sob pena de pagar uma penalidade adicional na rescisão. Ou seja: se a empresa reduziu jornada 2 meses, ficará 2 meses com o trabalhador com jornada normal. Se quiser demitir nesse período, paga a multa. Quanto maior a redução de jornada aplicada, maior a multa.
f) A suspensão vale por 60 dias e a redução por 90. O prazo total da redução ou suspensão, e do pagamento do benefício, nunca pode ultrapassar 90 dias. Assim, o empregador pode suspender por 30 dias e reduzir jornada por 60.
Ainda, prevê-se que será possível estabelecer acordo individual de redução e suspensão para dois grupos, quais sejam, aquele integrado por empregado que percebem até R$ 3.135,00 por mês, e por empregados considerados hipersuficientes pela Consolidação das Leis do Trabalho, ou seja, os que tem curso superior e recebem salário igual ou superior à R$ 12.202,12 e com curso superior.
Neste aspecto, há de se observar que:
a) Para os empregados que recebem salário acima de R$ 3.135,00 e abaixo de R$ 12.202.12, será necessária a celebração de acordo coletivo, salvo para a redução de jornada de 25%, o que poderá ser por acordo individual. A justificativa é de que esse grupo não é considerado hipersuficiente e sofrerá mais o impacto da suspensão ou redução de jornada de 50% e 70%.
b) O acordo coletivo é sempre possível. Se os percentuais de redução de jornada forem diversos dos previstos na Medida Provisória 936, o benefício será calculado da seguinte forma:
i) o Redução de jornada menor que 25%: sem benefício;
ii) o Redução de jornada igual ou maior a 25% e menor que 50%: 25% da base de cálculo;
iii) o Redução de jornada igual ou maior a 50% e menor que 70%: 50% da base de cálculo;
iv) o Redução da jornada igual ou superior a 70%: 70% da base de cálculo.
Relevante saber que a redução de jornada deve preservar o valor do salário-hora.
Entretanto, importante convocar atenção ao fato de que se o empregado tiver feito acordo individual mais favorável ao acordo coletivo posterior, poderá manifestar-se expressamente pela manutenção do seu acordo individual, optando por aquele que lhe for mais favorável.
As empresas que optarem pela redução de jornada – e, portanto, salário – ou pela suspensão do contrato de trabalho deve observar que benefício terá data de início na data de início desta redução ou da suspensão, as quais e hão de ser informadas em até 10 dias. Não havendo informação neste dia, a empresa fica responsável por pagar o salário até que preste a informação; por exemplo: havendo informação depois de 20 dias, a empresa paga 20 dias de salário normal e o empregado recebe o benefício pelo tempo restante do acordo.
No caso dos trabalhadores contratados no regime de intermitência, o governo utilizará os registros nos sistemas e fará o pagamento automaticamente.
Com efeito, devemos salientar que os empregados não são obrigados a aceitar, eis porque muitas empresas os estão “convidando” a promover acordos de redução de jornada/salário ou de suspensão do próprio contrato de trabalho – aos empregados resta a difícil missão de aceitar ou não o “convite”, ponderando o risco de não o aceitar.
Certo é, estamos vivendo tempos anômalos e não há como se esquivar de medidas necessárias à manutenção do emprego e da renda ou ao menos se aproximar ao máximo desta incerta garantia.
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) desenvolveu uma calculadora para auxiliar os empregados e as empresas e simularem o impacto da MP 936 sobre a remuneração dos trabalhadores, a qual pode ser acessada pelo sírio do departamento (link: https://www.dieese.org.br/materialinstitucional/apresentacaoCalculadoraMP936.html).
Por fim, rogando escusas pelo emprego de linguagem coloquial, raras vezes um remédio tem sabor palatável, mas é necessário obedecer a prescrição médica para se combater a patologia cujo progresso se busca estancar.
[1] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados e Owner e Legal Coach de Lawyers Coaching/Desenvolvimento de Performance e Competências Jurídicas – Conselheiro Secional da OAB/SP – Membro da IV Câmara do Tribunal e Ética e Disciplina da OAB/SP – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB Nacional – Presidente da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP – Membro Efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/RJ – Membro da Comissão de Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Professor de Pós-Graduação Direito Processual do Trabalho– Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (AATSP) –Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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