A Revogação das regras de coparticipação e franquia em planos de saúde e perspectivas
Renata Cristina Marques Ferreira[i]
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou nesta quinta-feira em junho passado Resolução Normativa nº 433, apor meio da qual buscou estabelecer as regras para a aplicação da coparticipação e franquia em planos de saúde.
Para que se compreenda melhor a questão, oportuno definir – mesmo que em breves linhas – o que vem a ser coparticipação e franquia: a) coparticipação é o valor pago pelo consumidor à operadora em razão da realização de um procedimento ou evento em saúde e b) franquia é o valor estabelecido no contrato do plano de saúde até o qual a operadora não tem responsabilidade de cobertura.
A norma protege o consumidor ao estabelecer um percentual máximo a ser cobrado pela operadora para realização de procedimentos; ao determinar limites (mensal e anual) para exposição financeira do consumidor; além de isentar a incidência de coparticipação e franquia em mais de 250 procedimentos – tais como exames preventivos e tratamentos de doenças crônicas, entre eles, tratamentos de câncer e hemodiálise, bem como – sendo também prevista a proibição da cobrança de franquia diferenciada ou coparticipação por doença ou patologia exceto no caso de internação psiquiátrica.
Com a medida, a ANS buscou suprir as lacunas existentes na legislação, garantindo maior previsibilidade, clareza e segurança jurídica aos consumidores.
De acordo com a referida resolução, a coparticipação do segurado foi limitada à razão máxima de 40% (quarenta por cento) do valor do procedimento ou evento em saúde efetivamente pago pela operadora de plano de saúde ao prestador ou do valor da tabela de referência de procedimentos.
Estabeleceu-se que os limites mensais e anuais poderão ser aumentados em 50% (cinquenta por cento) em planos de saúde empresariais que prevejam o referido aumento em acordos ou convenções coletivas de trabalho. Em sendo ultrapassado o limite, as operadoras arcarão integralmente com os custos da utilização do plano, sendo vedada no ano seguinte a cobrança dos valores excedentes.
No caso do beneficiário ser atendido em pronto-socorro, o valor a ser cobrado deverá ser fixo, único e de prévio conhecimento pelo beneficiário e contemplar todos os serviços e procedimentos, não podendo ser superior a 50% do valor da mensalidade, nem maior que o valor pago pela operadora ao prestador de serviço. Já, no caso de internação o valor também será fixo e único não podendo ser superior ao valor da mensalidade.
A regra do valor fixo e único previsto no contrato deverá valer para todos os estabelecimentos de pronto-socorro que estejam na rede credenciada do plano contratado pelo beneficiário.
No tocante a coparticipação tem-se as seguintes modalidades: 1) valor fixo sobre o procedimento, grupo de procedimentos ou evento em saúde devido a título de coparticipação; 2) percentual a sobre os valores previstos em tabelas de referência que contenha a relação dos procedimentos, grupos de procedimentos e eventos em saúde sobre os quais incidirá a coparticipação e 3) percentual sobre o valor monetário do procedimento, grupo de procedimentos ou evento em saúde, efetivamente pago pela operadora ao prestador de serviços em saúde.
De acordo com a Agência Nacional de Saúde, quando a modalidade de coparticipação prevê percentual incidindo sobre valor efetivamente pago ao prestador, será obrigatório a operadora a prestação de informação referente ao valor cobrado quando solicitado pelo beneficiário do plano de saúde. Ademais, é facultada ao beneficiário a prévia consulta do valor do procedimento.
Com relação a franquia, as novas normas estabelecem as seguintes modalidades:
Franquia limitada por acesso, por meio da qual a operadora não se responsabiliza pela cobertura de despesas assistenciais até o valor determinado em contrato, cada vez que o beneficiário do plano de saúde acessa rede credenciada, referenciada, cooperada ou, em contratos em que haja previsão de livre escolha e o beneficiário acessa prestador de fora da rede da operadora.
Franquia dedutível acumulada, por meio da qual a operadora não se responsabiliza pela cobertura das despesas assistenciais acumuladas no período de doze meses contados da assinatura ou do aniversário do contrato até que seja atingido o valor previsto no contrato como franquia.
Importante salientar que se prevê a obrigação de que estejam previstos nos contratos os procedimentos e serviços que incidirão a cobrança de franquia e coparticipação, os isentos, a forma de aplicação e valores, os limites de exposição financeira, os valores fixos referentes aos atendimentos em pronto-socorro e internações e os critérios, em havendo previsão, de reajuste de valores. Os contratos de planos de saúde com coparticipação e franquia firmados antes da entrada em vigor do ato normativo não se sujeitarão às novas regras.
Ocorre, desde o dia 16 de julho as novas regras previstas na Resolução Normativa 433 da Agência Nacional de Saúde Suplementar foram suspensas liminarmente por decisão da Ministra Carmen Lúcia, então Presidente do Supremo Tribunal Federal, em decisão concedida nos autos da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 532 protocolada no dia 13 de julho pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
De acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil, a Agência Nacional de Saúde Suplementar utilizou-se das competências dos poderes Executivo e Legislativo ao regulamentar a matéria. Além disso, a Ordem dos Advogados alega que o acesso aos planos de saúde estaria ameaçado “visto que as novas regras sobrecarregarão os parcos rendimentos e afetarão os orçamentos domésticos de milhares de famílias”.
Na decisão, a Ministra Carmen Lúcia afirmou que eventual mudança poderia acontecer “somente com ampla discussão na sociedade” e a ANS decidiu por revogar a Resolução Normativa nº 433.
A decisão foi tomada durante a 490ª Reunião Ordinária de Diretoria Colegiada. A ANS “decidiu reabrir as discussões sobre a proposta de regulamentação dos mecanismos financeiros de regulação: coparticipação e franquia em função da apreensão que o tema tem causado na sociedade”.
Em nota, a ANS disse ainda que “se reunirá com as principais instituições públicas que se manifestaram sobre a matéria, com o objetivo de ouvir suas sugestões para a construção de um entendimento uniforme sobre o assunto”.
Certo é, chegou-se a um ponto em que as operadoras de planos de saúde não estão suportando o custeio de todos os materiais, medicamentos e procedimentos; por outro lado, os usuários por muito já não suportam os valores cobrados e os aumentos impostos, sendo necessário que a questão seja equacionada da melhor forma possível.
Muitas audiências públicas se realizaram – ainda sem avanços concretos – e outras tantas se realizarão e a expectativa é que se acabe por permitir a coparticipação e franquia, mas em limites aceitáveis e quiçá com um controle mais rígido no que concerne ao aumento das mensalidades.
A ANS não desistirá da regulamentação e, por certo, ainda haverá muita discussão!
[i] Advogada desde 2005 – OAB/SP 235.138 – Advogada responsável pela unidade de Santos e litoral.
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