Suspensão de passaporte e CNH – Atentado ao direto de locomoção
Fernando Borges Vieira[i]
Suspensão passaporte e CNH. Indevida. A suspensão dos documentos pretendida atenta contra o direito de ir e vir dos executados, direito este garantido constitucionalmente. Além disso, não comprovou o agravante que tal medida tivesse efeito prático e efetivo, tendo ele mesmo, nas razões de agravo, indicado razões para a ineficácia e inutilidade da determinação. Portanto, deve ser mantido o indeferimento. (Processo 00021431520115020383)
Em consonância com o acórdão relatado pela Desembargadora do Trabalho Sonia Maria Forster do Amaral da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Acórdão 20180072140) negou, por unanimidade, provimento ao Agravo de Petição interposto nos autos da reclamatória 0002143-15.2011.5.02.0383, cujo trâmite se dá perante a 03ª Vara do Trabalho de Osasco/SP.
Assim votou a Desembargadora Relatora:
Conheço do agravo, porque regular e tempestivo.
DA SUSPENSÃO DO PASSAPORTE E DA CNH Pretende o agravante a reforma da decisão que indeferiu expedição de ofício determinando a suspensão do passaporte e CNH dos sócios executados. A prerrogativa de determinar as medidas coercitivas, mandamentais, prevista no art. 139, IV, do CPC, não pode ser interpretada de modo absoluto, de maneira a se entender que o juiz pode acolher qualquer pretensão das partes.
No caso, como bem salientado na decisão de origem, a suspensão dos documentos pretendida atenta contra o direito de ir e vir dos executados, direito este garantido constitucionalmente.
Além disso, não comprovou o agravante que tal medida tivesse efeito prático e efetivo, tendo ele mesmo, nas razões de agravo, indicado razões para a ineficácia e inutilidade da determinação. Acresça-se que se os executados estão usufruindo de bens luxuosos ou ostentando riqueza, caberia ao agravante perquirir e demonstrar suas alegações através, ao menos, de indícios, o que não ocorreu.
Portanto, deve ser mantido o indeferimento.
Nada a reformar.
Importante destacar que a prerrogativa de determinar as medidas coercitivas, mandamentais, são previstas no artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: […] IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
Todavia, conforme bem asseverado no acórdão em comento, não se trata de prerrogativa absoluta e deve ser muito bem sopesada pelo julgador, tal como se deu em primeira instância por força do despacho do Juis do Trabalho Ronaldo Luís de Oliveira:
INDEFIRO o requerido, uma vez que a medida coercitiva objetivada, com fulcro no disposto no artigo 139, IV, do CPC/2015, não é razoável, nem proporcional, atentando, inclusive, contra a Constituição Federal de 1988 que consagra o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito fundamental de ir e vir.
O fundamento que levou ambas instâncias a negar o pedido do Reclamante repousa no fato de que a liberdade de locomoção é um direito fundamental de primeira geração que se goza em defesa da arbitrariedade do Estado no direito de ingressar, sair, permanecer e se locomover no território brasileiro.
Este direito encontra-se acolhido no seio do inciso XV do artigo 5º da Constituição Federal, o qual estabelece ser livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.
A liberdade de locomoção é um desdobramento do direito de liberdade e não pode ser restringido de forma arbitrária pelo Estado, de forma que há de se respeitar o devido processo legal para que haja esta privação, tratando-se de princípio explicito na Constituição Federal cujo objetivo é criar procedimentos para as relações jurídicas oferecendo aos governados uma segurança jurídica quanto aos seus direitos, conforme inciso LIV do artigo 5º.
Ademais, tal como preconiza o inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal, a privação desta liberdade deve se dar por ordem escrita e fundamentada, razão pela qual o fundamento deve considerar – além da privação em referência – a utilidade da suspensão do passaporte e CNH que, em razão última, trata-se de mera punição ao devedor e não de meio efetivo para a satisfação do crédito trabalhista.
Com efeito, a infundada suspensão do passaporte e da CNH se trata, efetivamente, de atentado ao direito de locomoção previsto pelo texto constitucional como direito fundamental do cidadão.
[i] Advogado desde 1997 – OAB/SP 147.519 e OAB/RJ 213.221 – Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados – Bacharel em Direito (FMU) – Especialista em Compliance (Insper) – Especialista em Compliance Anticorrupção (LEC) – Especialista em Liderança (FGV – GVlaw) – Especialista em Direito Processual Civil (CPPG/FMU) – Mestre em Direito (Universidade Mackenzie) – Certificado em Compliance Anticorrupção (LEC) – Personal, Professional e Leader Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC) – Professor de Pós-Graduação Direito Processual do Trabalho – Diretor do Núcleo de Direito Processual do Trabalho da OAB/SP/Jabaquara – Membro da Comissão Especial de Coaching Jurídico da OAB/SP – Associado Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) – Associado à Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) – Associado à Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (ABRAT) – Associado à Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (ATSP) – Associado ao Instituto Brasileiro de Compliance (IBC) – Associado ao Instituto de Compliance do Brasil (ICB) – Palestrante OAB/SP e Escola Paulista de Advocacia – Autor e coautor de obras e relevantes artigos jurídicos.
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